sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

CARROÇAS VAZIAS

Estação Ferrovária Central de Juiz de Fora
Estação Ferroviária central de Juiz de Fora (outro ângulo)
Saint’Clair Luiz do Nascimento
Guardo em meu relicário o opúsculo Só me Resta Uma Saudade, um instrumento narrativo das memórias de meu amigo Luiz Carlos Mendes, enriquecido por outros, como Encontro de Vida e Um Sopro de Saudade, este um tributo de Luiz, de sua alma poética, à sua ancestralidade, no qual nos desvenda por inteiro, o seu eu, pleno e rico das virtudes mais caras do imenso ser humano que ele é.
Existe um, porém, que mexe com meu imo, que é A Herança do Carroceiro, em que narra a saga do patriarca João Gomes, o carroceiro “João Manata”, apelido curioso, “que a bruma do tempo escondeu de mansinho” no pensar e dizer da professora Maria do Carmo Volpi de Freitas, a saudosa Dona Carminha.
Luiz Carlos, no belo texto, nos conta o diálogo do velho com seu neto:
- Vem vindo uma carroça, vazia.
- Como sabe que vem vazia?
- Pelo barulho. É que as carroças vazias são sempre mais barulhentas que as cheias.
A metáfora é mui apropriada para retratar as pessoas ocas, mas muito exibidas, jactanciosas e barulhentas em suas vanglórias.
O pensamento despertou em mim, também, o antigo inconformismo com o trafegar constante dos comboios da MRS Logística, sempre rumo ao norte, sempre vazios, a paralisar, de hora em hora, o pulsar do coração da cidade e, por vazios, sempre fragorosos, trepidantes e barulhentos.
A via férrea, qual afiado gume, fere e fende a malha urbana de nossa querida Juiz de Fora, com assustadores estrondos em longos comboios de cem vagões, verdadeiras “carroças vazias”, puxados por duas ou três potentes locomotivas que se arrastam sobre os trilhos gastos e os dormentes podres, a prenunciar desastres.
A Ferrovia do Aço, que representava toda a nossa esperança de livrar a cidade do incômodo ferroviário, foi concebida e anunciada em 1973 para ligar, em via dupla e eletrificada, Belo Horizonte, São Paulo e Rio de Janeiro, que são as principais metrópoles brasileiras, no transporte de mercadorias, pessoas e capitais, sobretudo para escoar o minério de ferro das jazidas mineiras, requisitado pela COSIPA e pela CSN.
De 1973 a abril de 1989 decorreram 14 anos, quando as duas frentes da obra se encontraram no KM 138 da ferrovia, no município de Madre de Deus de Minas, dando-se por concluída a chamada “Ferrovia dos Mil Dias”, com exatos 5.098 dias, sem via dupla e sem eletrificação, que apenas leva de volta os vagões, agora carregados de minério para os auto-fornos do Rio e de São Paulo.
Enquanto isso, Juiz de Fora sofre com a cessão compulsória de espaço nobre e central, para tráfego de vagões vazios que provocam um estrangulamento perverso da urbe e não atendem, em nada, nossa laboriosa população e nem trazem riqueza ou bens para nossa terra.
A trafegabilidade de Juiz de Fora somente se resolverá, um dia, com a execução do projeto do Anel Ferroviário descrito em 2000 na Proposta Técnica da Construtora Queiroz Galvão e defendida, com denodo, por Julio Carlos Gasparete e outras lídimas lideranças de nossa terra, numa campanha supra-partidária.
Somente assim nos livraremos do empecilho das “carroças vazias” da MRS que trafegam pela malha ferroviária sudeste terceirizada da RFFSA, sem qualquer afinidade com nossa gente ou empatia com nossas aspirações de crescimento.

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